IMPALA 61. E EU QUASE PERCO O EMPREGO. Por Mário Rubial

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Rolava o ano de 1968. Eu trabalhava na Editora Abril, e o novo prédio tinha acabado de ser inaugurado na Av. Otaviano Alves de Lima, mais conhecida como Marginal Tietê. Está lá até hoje.

Havia um amplo estacionamento para os funcionários e a minha vaga, número 92, era a primeira a ser visualizada por todos que entravam. Inclusive os patrões. E lá eu estacionava meu valente Fusca 62, azul-desbotado.

Morava com meus tios. E meu tio Ignácio tinha uma fazenda de café em Ocauçu, interior de Sampa. 1968!

Imaginem que naquela época não havia internet, celular e um telefonema demorava horas, muitas horas.

E claro, na fazenda, não havia telefone! E como se comunicar?

O que era possível na época: um transmissor mastodôntico. E que, para haver comunicação, era necessário marcar dia e hora para falar.

E o único lugar para operar era no quarto que eu dividia com o Toninho, meu primo. Nossas camas, um armário e o dinossauro. Sim, dinossauro porque ocupava metade do nosso quarto!

Em dias e horários previamente combinados, o Aníbal, administrador da fazenda, chamava São Paulo. E ficávamos a postos, tentando decifrar o que ele falava. Ruídos, chiados e, vez por outra, captávamos algo.

Vida que seguia.

Para chegar na fazenda, meu tio dispunha de uma pick-up Rural Willys, um dos únicos veículos possíveis de atingir aquela região. Vocês podem imaginar como era a estrutura rodoviária daqueles tempos!

Certa ocasião, emergência! Aníbal liga e pede para que meu tio vá URGENTE para a fazenda. Nem lembro qual era o problema.

E a pick-up, verde-oliva, estava na oficina para reparos.

Meu tio Ignácio sempre gostou de bons carros. E ele adorava os americanos.

Nessa época, ele tinha um Impala 1961. Lindíssimo. Era branco, estofamentos e frisos laterais vermelhos e, hidramático, que hoje chamamos de automático.

Chega pra mim e diz:

– Marinho, preciso trocar de carro com você. Devo ir para Ocauçu com urgência e o Impala, nem pensar. Com aquelas estradas… Você me empresta o teu Fusca e fica com o Impala.

Sonhos dos sonhos! Fazer esse favor para o meu tio, era como ganhar na loteria. Não que fosse novidade dirigir  o Impala. Sempre que eu quisesse, podia sair com aquela maravilha. Mas ficar 10 dias com ele…

Aí deu-se o problema.

Como disse no início, minha vaga na Editora Abril era a primeira a ser visualizada. Numa época em que os melhores carros eram Opalas, DKVs, Fuscas, Aero-Willys, Simcas, surge um puta IMPALA lindo, absoluto, prepotente, quase como a desafiar aqueles pobres modelos nacionais.

Os donos da Abril, até pelo perfil, não ostentavam. O Sr. Victor Civita tinha uma perua Dodge 1952. O Robert, um Gordini. O único metido era o Richard, que tinha um Mustang.

Mas o único que sobressaia era o IMPALA. Branco, brilhante e com aqueles frisos vermelhos…

Eu trabalhava no Departamento de Produção Publicitária. Meu cargo era de Supervisor respondendo ao Francesco Bitetto, figura lendária daquela época. Um grande amigo.

Nossas mesas eram dispostas uma de frente a outra.

Certo dia, ele atende o telefone interno e ouço:

– Sim, Dr. Richard, sim, já subo, sim, claro, sim…

Pergunto:

– Franz, algum problema?

– Não Marinho, não deve ser nada. Sabe como é, o Richard está sempre atacado… e rimos muito.

Meia hora depois, chega o Bitetto.

– E aí, pergunto?

Bitetto cai na risada.

– O Richard queria saber quem era o ocupante da vaga 92. Quando soube que era você, e que seu salário não era alto, pensou que estivesse roubando.

– Tive de explicar que sua família tinha recursos, que você morava com ela e que, afinal, o Impala custava bem menos do que aquela merda de Gordini  que o Robert usava! E bem menos que o Dodge do Sr. Victor.

Morremos de rir e fomos comemorar com um belo almoço no Terraza Romana, restaurante italiano que havia na Lapa.

E tem outra história interessante:

O BItetto era um italiano peculiar, um grande barato.

Adorava comer e beber bem, como todo italiano.

Hoje, beber cachaça é até charmoso. O que não faz o marketing…

Mas na época, 1970, por aí, beber pinga era sacrilégio.

Pois bem! Bitetto não queria nem saber. Pedia pinga, como se fosse um Brunello de Montalcino! E ai de quem o recriminasse.

Certo dia, chegamos no Don Fabrizio, primeiro restaurante do Mario Tatini que ficava na Alameda Santos, em frente ao Rubayat.

Bitetto pediu uma cachaça.

O barman disse:

– Nâo servimos cachaça!

Bitetto, então pediu:

–  Va bene, então voglio uma caipirinha.

– Perfeito, senhor. Salta uma caipirinhaaaa!

Nesse momento,meu amigo Bitetto teve um ataque de fúria! E no seu portuliano disse:

– Ascolta  signore. Se não tem pinga, como se faz a caipirinha?

O garçom, sem graça, pediu desculpas e serviu a cachaça. Que era a Velho Barreiro.

Na saída, pagamos a conta e, o Bitetto, meteu a mão no bolso, puxou uma nota de cinquenta e deu para o balconista.

Era um baita gorjeta.

E diante do espanto do balconista, BItetto falou:

– Aprenda a lição, meu chapa. A cachaça, que vocês repudiam,é igual ao whisky, à vodka, ao rum, etc., etc. e  que, ao final, é a cachaça dos ingleses, dos russos… e por aí vai.

Saudade do meu amigo!

 

DICA DE BOTECO

Dr. Tchê La Parrila de La Villa

Rua França Pinto, 489 – 5575-9625

Vila Mariana

Sampa

Grelhados maravilhosos. Experimente a fraldinha. A melhor do mundo!

 

FRASE DE BOTECO

No Líbano, os livros são lidos de trás para a frente.

É por isso que a Agatha Christie não vende nada por lá.

Eugênio Mohallem

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