Em setembro de 1971, a convite do Eduardo dos Santos Pereira Neto, fui para a Rádio Nacional (hoje Rádio Globo) , onde o diretor de jornalismo era o James Rúbio, e o secretário de redação o Olavo Marques. Fiquei só 5 meses e me mudei para a redação ao lado, que era da TV Globo, dirigida pelo jornalista Paulo Mário Mansur. Fui editor do telejornal “Hoje”, por sugestão do Affonso Carlos Pozzi. A apresentadora era Neide Alexandre. A Marilia Gabriela era repórter e fazia uma seção de modas. O João Leite Neto e o Hércules Breseghello também eram repórteres, além de tantos outros grandes companheiros como o Laerte Mangini, Neusa Rocha, Odair Redondo. Aqui cabe um parêntesis. A Neide chegava à redação sempre 1 hora antes, para ensaiar o texto e ver as imagens que iam para o ar. Esse ensaio era feito na sala de montagem, relativamente pequena, mas muita gente aparecia por lá. Não sei se por causa da Neide, toda linda e perfumada ou “só” para acompanhar o ensaio…
Seis meses depois fui para o Jornal Nacional substituindo o jornalista Walfrido de Grammont. Ele havia sofrido um acidente horrível na avenida Francisco Matarazzo, junto com apresentador Sergio Roberto. Ficou bom, voltou para a televisão e foi chefiar a filial de Belo Horizonte. Não muito tempo depois o Walfrido teve problemas no coração e acabou mudando para o céu.
Naquela época, como se diz hoje, “a televisão era movida a lenha”. Os cinegrafistas usavam filme e, não raro, perdíamos toda a matéria porque o filme tinha “velado”. Isso aconteceu várias vezes e em muitas os repórteres tinham viajado 2 ou 3 dias, feito uma senhora cobertura e ia tudo por água abaixo. As entradas no Jornal Nacional, de São Paulo, eram ao vivo e no meu período – três anos – passaram pelo JN três apresentadores: Livio Carneiro, Ferreira Martins e Sérgio Roberto.
Com o Livio aconteceu um fato inusitado. O Jornal Nacional estava no ar e tínhamos duas entradas aqui de São Paulo. A primeira, antes do noticiário internacional. A segunda, depois. Houve a primeira entrada e, como estava muito calor, mesmo com o ar condicionado, o Livio tirou o paletó e afrouxou o nó da gravata. De repente o Cid Moreira chama São Paulo de novo, pegando o Livio desprevenido. Ele levantou vestindo o paletó e apertando a gravata, tudo ao mesmo tempo e correu para sentar na banqueta, de onde apresentava o jornal. Na correria, quando ele se sentou, a banqueta virou e o Livio acabou levando um tremendo tombo. Quem assistia ao telejornal viu o apresentador só passando pela tela… Quase perdeu o emprego. Depois desse acontecimento saiu uma ordem geral para toda a rede: “durante a apresentação do telejornal fica proibido o apresentador levantar-se, seja qual for o motivo”.
Naquela época o logotipo JN era recortado em papelão e colado na tapadeira, atrás do apresentador. Todo dia a mesma novela. Mais pra esquerda, mais pra baixo, mais pra cima, até que a enquadração ficasse perfeita. Um dia, porque não foi bem colado ou por qualquer outro motivo, o logotipo caiu com o telejornal no ar. Isso, na Globo, era motivo de demissão do funcionário responsável. E ele foi demitido mesmo, sem direito de defesa, em nome da “qualidade Globo”. Às vezes até exageravam nessa “qualidade”. Os ternos, as camisas e as gravatas dos apresentadores eram escolhidas a dedo e tinham que estar sempre à altura das exigências globais, cujas regras eram sempre ditadas pelo José Bonifácio de Oliveira Sobrinho, o Boni.
Até cartilhas eram distribuídas a todas as praças, sugerindo linguagem mais coloquial. Por que dizer alcaide ou chefe do Executivo em vez de prefeito? Edil não se pronunciava. Não é mais fácil dizer vereador? Havia outras tantas terminantemente proibidas e acabamos descobrindo que escrever mais fácil é apenas uma questão de hábito.
Fausto,
adorei a crônica. Como você sabe, também trabalhei na TV Globo. e era isso mesmo: profissionalismo levado ao extremo.
abs,
Marinho
Tive a honra de trabalhar com você nessa época, ainda no jornal Hoje. Você me ensinou muito, eu era apenas um moleque em início de carreira. É incrível como a gente esquece de certas coisas… Sua descrição do posicionamento do logotipo do JN me deixou rindo sozinho, não me lembrava mais disso. O diretor de TV colocava uma barra preta na altura em que o logotipo deveria estar e ficava comandando o assistente de estúdio pelo fone até que estivesse na altura certa e no prumo. Só quem viveu sabe como era, dia após dia. Mas quanta gente boa saiu daquela escola, dá uma saudade louca.
Foram tempos difíceis de um grande projeto que estava começando. Do Fausto tenho a lembrança de um companheiro bondoso e leal que me orientava e incentivava. Acabei não ficando no Jornal Nacional, mas ganhei meu lugar na bancado do Jornal Hoje. E foram anos felizes, mesmo depois que o Paulo Mário Mansur deixou de ser diretor e passamos a ser dirigidos pelo Luiz Fernando Mercadante. Mas o ambiente estava deixando de ser amistoso. Chegavam colegas oriundos da imprensa escrita que não tinham boa vontade com quem já estava lá. O próprio Mercante quis que fosse fazer um estágio no Jornal da Tarde, como estratégia para que conquistasse o respeito desses novos colegas. Fui deslocado para o Bom Dia São Paulo e continuei resistindo. Mas no início dos anos 80 fui colocado à disposição do Globo Rural. Se desse certo ficava, caso contrário seria demitido. Resisti e contei com a boa vontade dos novos colegas que me ensinaram grandes lições e foi o meu segundo bom momento na Globo. Mas tenho muita saudade daquele começo ao lado de colegas como Afonso Carlos, Paulo Leite, Ivan Rodrigues, Neusa Rocha e Fausto Camunha, entre outros.