O editorial de domingo do Estadão analisa declarações do presidente dadas nas últimas semanas dirigidas ao fã-clube do “cercadinho”. “Ou fazemos eleições limpas no Brasil, ou não temos eleições”. O jornal enaltece que, para Bolsonaro, eleições “limpas” significa eleições do jeito que ele quer com voto impresso, com sua vitória. Se não for assim, não vale e ele pode insuflar sua turma e atear politicamente fogo no país. Relembre-se que ele blefa pois afirmou sem nunca apresentar qualquer demonstração de fraude nas eleições de 2014 ou 2018.
E, como se sabe, 11 partidos importantes, detentores de quase 2/3 da representação política do Congresso, vieram a público se posicionar no sentido de que a proposição do voto impresso auditável é absurda. Ou seja: não passará, pois não terá os votos necessários para isto.
Como se não fosse suficiente, os ex-Procuradores-Gerais Eleitorais vieram a público também assumir clara posição em defesa da urna eletrônica nos moldes atuais, sistema que, aliás, já permite a auditabilidade de boletim de urna por boletim de urna. Os representantes maiores do MPF nas últimas eleições chancelaram o pleno e efetivo funcionamento do sistema, que oferece toda a necessária segurança jurídica e é adotado em dezenas de países do mundo.
O que apareceu com força – que não se teve para liderar o país na crise da pandemia – foi uma nota pública sob pretexto de excessos verbais, assinada pelos chefes das Forças Armadas, dirigida ao Presidente da CPI, interpretada como um “cala boca” e ao mesmo tempo um possível salvo conduto ao presidente da República, que foi devidamente rebatida com o necessário vigor pelo presidente do Senado. Se levarmos em conta que a elevação da temperatura na CPI guarda direta relação com a focalização dos trabalhos na verificação dos escândalos de corrupção que vieram à tona, as coisas começam a ficar mais claras. Sem deixarmos de registrar que justamente nesta semana o presidente da CPI deu voz de prisão a uma testemunha.
E além destes fatos, no mesmo domingo do editorial, pesquisa realizada pelo Instituto Datafolha, que entrevistou 2074 pessoas presencialmente, aponta que para 70% delas há corrupção no Governo Bolsonaro. Em relação ao segmento feminino, o percentual sobe para 74%, no universo jovem, 78%, assim como na região nordeste.
Está cada vez mais difícil para o presidente repetir sua frase folclórica que a corrupção acabou ou que no seu Governo ela não existe, diante de tudo que se descortina a cada dia, havendo sinalização grave no sentido de que a seletividade imposta pelo fator propina pode ter sido decisiva para o atraso no processo de aquisição de vacinas.
Investigação profunda é o único caminho, com responsabilização dos culpados, inclusive de prevaricadores – até do presidente, se houver os elementos necessários. E respeito total à vontade soberana do povo nas eleições. Se o presidente for candidato e vencer, terá o direito de exercer o poder por mais quatro anos. Mas, se for vencido, deve respeitar a vontade do povo, mesmo que isto ocorra pelo sistema eleitoral atual, que conferiu a ele sete mandatos consecutivos de Deputado Federal nunca questionados.